No dia 2 de outubro, durante o primeiro turno das eleições, parte da população brasileira que defende a Amazônia assistiu, assustada, a quantidade de votos que os candidatos da extrema direita receberam, o que inclui os votos no presidente Jair Bolsonaro. A expectativa era de que dois fatores pudessem ter desestimulado seus potenciais eleitores: o negacionismo na condução da pandemia, que resultou em um número de mortos incomumente alto no Brasil, quase 700 mil, e os números recordes de desmatamento da Amazônia durante sua presidência. A perda de árvores desestabilizou o clima do Brasil e resultou em ondas de calor nas principais cidades do país, incluindo uma nuvem negra que cobriu a cidade de São Paulo em setembro de 2020.
Nada disso, porém, foi suficiente para eleger seu opositor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no primeiro turno. Com isso, a Amazônia está, novamente, na berlinda quando os brasileiros votarem novamente no dia 30 de outubro. Só nos três primeiros anos do governo Bolsonaro foram desmatados 33.200 quilômetros quadrados da Amazônia brasileira. São os maiores índices de desmatamento dos últimos 13 anos. Dos nove países que comportam a floresta amazônica, o Brasil é o que apresenta o pior nível de desmatamento e degradação do bioma: 34%. O índice da Bolívia, segunda colocada no ranking, é dez pontos menor, de 24%.
Antes dessas eleições, ao longo dos 522 anos do Estado brasileiro apenas dois indígenas haviam sido eleitos para o Congresso, o primeiro—Mário Juruna—no ano de 1982, e a segunda— Joênia Wapichana—no ano de 2018. Mas nestas últimas eleições, mais dois de nós triunfamos: eu e Célia Xakriabá. É a primeira vez na história do Parlamento brasileiro que haverá mais de um representante indígena ao mesmo tempo.
Apesar dessa boa notícia, a realidade da política atual brasileira é devastadora para a Amazônia, pois, além da subrepresentatividade indígena no poder legislativo brasileiro, o novo parlamento eleito conta com uma maioria apoiadora de Bolsonaro, os quais defendem a abertura das terras indígenas para exploração de minério, a monocultura dependente de agrotóxicos, a diminuição da quantidade de unidades de conservação, a flexibilização da legislação ambiental, dentre tantas outras medidas que visam introduzir, sem controle, na Amazônia um modelo predatório de exploração econômica.
Os próximos quatro anos são cruciais para a floresta tropical. Partes da Amazônia podem já ter passado por um ponto crucial, após o qual a paisagem verdejante começa a se degradar em savana, e a floresta emite mais carbono do que absorve. Se Lula vencer, ele se comprometeu a liderar um “combate implacável” contra o desmatamento ilegal, restaurando a aplicação do nosso código florestal, replantando áreas desmatadas e trazendo a taxa de desmatamento para “zero líquido”. Seu caminho será complicado pelo grande número de legisladores antiambientalistas. Mas análises recentes de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais do Brasil, da Universidade de Oxford e do Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados, sugerem que uma vitória de Lula poderia reduzir o desmatamento na Amazônia brasileira em 89% até 2030.
Este ano, parece que o Brasil está voltando no tempo: reencontrando a fome, aumentando o índice de assassinatos de defensores de direitos humanos e do meio ambiente, e reintroduzindo modelos ultrapassados de exploração econômica que desconsideram a emergência climática na qual nos encontramos.
Recentemente, o professor, jurista e filósofo Silvio Almeida disse que o voto no Lula “carrega a esperança” de um país ideal que talvez nunca tenha existido e que, por isso, não é o caso de reconstruirmos o país, mas sim começarmos do zero a construção de um país mais justo, solidário, livre de racismos e que compreenda a importância de abrigar a maior floresta tropical do planeta.
O segundo turno das eleições brasileiras será crucial para esse novo país. Por um lado, se Lula for eleito temos uma chance, ainda que difícil, de mantermos a Amazônia em pé. Por outro lado, se Bolsonaro for reeleito, a floresta estará fadada ao seu fim e, com ela, toda a humanidade.
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